Home Geral Amanhã também aí hei de estar | por Iron Junqueira

Às vezes tento recordar algo que me alegrou, mas qual o quê, não tem jeito, a memória não responde. Olho a extensão do dia claro, manhã de janeiro, as pessoas estão banhadas do sol do quase meio dia, com suas roupas coloridas e alegres. A luz que promana das alturas infinitas mostra a barra do céu se unindo a terra e eu fico a pensar como o povo nãose apercebe do seu sofrer neste mundão de provas e expiações. Não se tocou, sequer, pelas provações que o dia a dia trás. Mas o homem sofrido contabiliza cada minuto vivido e marcado pelas aflições e dores lancinantes.

Caminho lentamente pela via sem notar que tão lentamente ando que um veículo quase me atropela. Senti que o motorista fez menção de gritar comigo, mas não o fez. Por que não sou maisatento no caminhar, talvez porque não precisei correr na vida nos dias de ontem; talvez porque as preocupações sempre pesaram minha fronte para frente. Nada. Ando lento porque quase já não enxergo e preciso ficar atento. O vento da manhã sopra no meu rosto. O tempo ininterruptosussurra seus poemas que me privam de ouvir os sons que ecoam, porque ando quase surdo… Foram as rajadas e os vendavais da caminhada que marcaram meu ser com tantos padecimentos e olho as pessoas com a pureza de quem vê a passarada enfeitando as matas e os lados marrons e verdejantes da natureza.

Às vezes tento e me esforço para recontar casos antigos, mas parece que já se apagaram todos do livro de minha memória. Meu Deus! Já estou tarde no viver! E os pecados e maldades do mundo, eu percebo serem apenas dias risonhos e lindos dos que passeiam pelas primaveras e verões. Distantes ainda de conhecerem os rebenques das expiações que conheci. Os dias de novas auroras estão para mim apontando, pois já andei demais. Mas todos os viajantes da vida terão momentos assim, repletos de farturas eternas se não se deixarem enganar pelas riquezas pouco duráveis da matéria.

Estou meio cego e meio surdo. Foi o que lhes falei. Mas eu não me esqueci de dizer a vocês que, se assim estou agora, não é por culpa de ninguém, nem de Deus nem de meus pais, foi por definição do meu desiderato… Escrito com minhas penas e pesares, com os meus méritos ou com os meus deméritos. Se, de quando em vez, bate no peito o doer da saudade, escuto ao longe o cantar da cotovia ou espio o voar da águia e me vejo em todo tempo, idade ou local. A vida é assim. Plena de momentos de aprender que enriquecem; e quanto mais de Sabedoria nos crescer, mais de Amor também nos veremos repletos, formatando as asas do ascender e do evoluir rumo à felicidade que é estado interior.

Assim como existem os instantes do amanhecer e do entardecer, há o do anoitecer; para nós igualmente há estes momentos: a infância, a mocidade e o retornar…

Sou daqueles que deixo me levar pelas asas da vida e, sendo o viver permanente, vocês hão de me ver por aí, pousando, sim, nos orbese bebendo os pingos de luz das estrelas, por isso são elas tantas.

Antes que me esbarrem os agitados da vida, e quebrem minhas pernas e meus modos de ser, torno-me ao meu lar, onde estou como sempre esperado como a mim esperam muitos, e todos amam a mim quanto eu os amo também. Afamília é a sede do Homem estando ele com filhos esposa e entes queridos, ou estando para lá do Além, onde os seres sorriem para o amanhã como a dizer…

Amanhã também aí hei de estar. É isto.

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