Home Editoriais Cidades Veganismo, um movimento social que começa no prato

Em dois anos, adeptos começaram a investir no setor e mercado vegano começou a se tornar bem mais conhecido em Anápolis

ANA CLARA ITAGIBA

Estima-se que cerca de 5 milhões de brasileiros se¬jam adeptos do veganismo. Os dados são da Socieda¬de Vegetariana Brasileira (SVB), que afirma ainda que de janeiro de 2012 a julho de 2016, as buscas no Google pelo termo “vegano” aumentaram 1000% no país. O interesse neste estilo de vida faz com que haja um crescimento considerável deste mercado, principal¬mente de restaurantes e empresas especializadas.

É o que tem acontecido em Anápolis. Nos últimos dois anos, adeptos come¬çaram a investir no setor e assim o mercado vegano começou a se tornar mais conhecido no município. Um dos primeiros locais especializado neste tipo de produto foi o restaurante Casa Veg, que fica na Rua 7 de Setembro, no Centro. Apesar de ter uma fachada simples, com só uma porti¬nha e uma placa indicando o comércio, o restaurante não fica vazio. O cardápio é extenso, o que possibilita agradar os diferentes gos¬tos. Entre os itens servidos estão as sopas, sucos natu¬rais, cookies, bolos, além da coxinha, empada e escondi¬dinho de jaca verde – quan¬do temperada, lembra fran¬go desfiado.

O dono, João de Deus, já trabalhava no ramo de ali¬mentação há seis anos, mas em 2015 se tornou vega¬no e logo no início do ano seguinte resolveu mudar o foco do seu comércio. O processo de adaptação du¬rou cerca de dois meses, mas o primeiro ano não foi tão bom. Em 2017, a situação virou e o negócio passou a dar mais lucro. Desde en¬tão, João tem pensado em ampliar mais ainda o seu menu.

O professor de histó¬ria Robson Aruta Monteiro resolveu deixar a cidade de São Paulo para investir no mercado vegano ana¬polino. Há dois meses, o jovem montou a Maria La¬cerda – Cozinha Vegana (@marialacerdavegan), com o auxílio de parentes que já moravam aqui. O negócio funciona como uma coope¬rativa, onde a família ajuda na produção dos alimentos que são entregues na casa dos clientes.

“Falei para eu mesmo que poderia tentar investir em Anápolis no veganismo, porque tinha e ainda tem pouco espaço. E a vantagem de trabalhar como coopera¬tiva familiar é que nós nos apoiamos. Um ajuda o outro e assim não há nenhum as¬salariado na casa”, explicou o dono do negócio delivery que produz coxinha de jaca verde, hamburguês de grão de bico e quibes de soja e berinjela defumada.

Mesmo com pouco tempo atuando em Anápolis, Rob¬son acredita que o merca¬do vegano aqui tem grande potencial para crescer cada vez mais. “Nesse período que estou aqui já vi muita gente mudando os hábitos para o vegetarianismo e nós já temos uma clientela grande. Além disso, temos cerca de seis clientes fixos, que sempre fazem pedidos”, revelou.

O comerciante João de Deus é também um dos ad¬ministradores do grupo de vegetarianos/veganos de Anápolis, que atualmente conta com 70 participantes. É a partir deste grupo que reuniões mensais são orga¬nizadas em parque da cida¬de para discutir estratégias de fortalecimento do movi¬mento no município. “Hoje o mercado vegano aqui está mais restrito a alimentação. Mas temos um projeto que está sendo trabalhado para que em um futuro próximo possamos agregar outros produtos. Isso engloba a vestimenta, os calçados, os produtos de estética e mui¬tos outros”, contou.

Robson acredita que é importante promover dis¬cussões como essa. “Deve¬mos disseminar o veganis¬mo aqui para ele crescer, porque Goiás tem muito espaço para a pecuária in¬dustrial. Temos de bater de frente com esse tipo de indústria. Temos que criar as nossas próprias marcas para ampliar a ideia. Isso é pelos animais, pelo planeta e por nós, seres humanos”.

A retirada dos alimentos de origem animal do cardá¬pio não é prejudicial à saú¬de, desde que a alimentação seja rica e balanceada com muitos cereais, frutas, ver¬duras, legumes e oleagino¬sas. Para substituir a pro¬teína da carne, a dieta deve ser rica em soja. Além disso, o adepto ao veganismo deve ter um acompanhamento com um profissional espe¬cializado.

Engajamento
Diferente do vegetaria¬nismo – alimentação ba¬seada no consumo de ali¬mentos de origem vegetal –, o veganismo propõe um estilo de vida que exclui do consumo qualquer produto ou alimento que advindo de exploração de animais. Ou seja, os veganos, além de não comerem alimentos de origem animal, não usam produtos de empresas que fazem teste em seres vivos e não vão a locais como zo¬ológicos, rodeios e apresen¬tações de circo.

“Quando eu comecei a entender como funciona¬va a indústria, eu parei de colocar sofrimento no meu prato”, declarou o Robson. O boicote a atividades e produtos que são contra os direitos dos animais é uma das principais ações prati¬cadas por quem adere ao movimento. Por isso, pode-se dizer que além de um estilo de vida, o veganismo é um movimento social.

“A produção animal tem um impacto tremendo no meio ambiente e no sofri¬mento dos animais. Hoje existem os abolicionistas animais. Aqui em Anápolis não temos esse grupo for¬talecido ainda, que são pes¬soas que trabalham no res¬gate. Eu tenho feito algumas ações isoladas, mas está faltando realmente agregar mais pessoas”, afirmou João de Deus.

História
Em 1944, o marceneiro Donald Watson, secretário da Sociedade Vegetariana de Leicester (UK), tentou garantir a criação de uma sessão para publicação de artigos que abordassem mais amplamente a questão dos direitos dos animais. A proposta não foi aceita, mas Watson não desistiu. Ele reuniu cinco vegetarianos para discutir a elaboração de uma filosofia de vida que pudesse beneficiar muito mais os animais. O marce¬neiro incomodava com o fato de que muitos vegeta¬rianos da época se alimen-tavam de ovos e laticínios.

Naquela época houve forte oposição, mas Watson insistiu na ideia e criou o termo vegan – abreviação de vegetarian – para se re¬ferir a quem não consumis¬se nenhum tipo de alimen¬to de origem animal. Três meses depois o marceneiro criou o boletim informa¬tivo Vegan News, que logo na primeira edição foi lida por mais de 100 pessoas, incluindo o renomado es¬critor irlandês e defensor do vegetarianismo George Bernard Shaw. Um dos fa¬tores que ajudou na popu¬larização do veganismo foi o fato de que 40% das vacas leiteiras da Grã-Bretanha contraíram tuberculose em 1943.

Apenas dois anos de¬pois, o boletim informativo de Vegan News que passou a se chamar The Vegan, já contava com mais de 500 assinantes. Lá eram publi¬cadas receitas, notícias so¬bre saúde, classificados e uma lista de produtos livres de ingredientes de origem animal. Com a popularida¬de do veganismo, surgiram livros como “Vegan Reci¬pes”, de Fay K. Henderson e “Aids to a Vegan Diet for Children”, de Kathleen V. Mayo.

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